06/01/2020
TRF-3 – Administrativo. Constitucional. Servidor público. União homoafetiva. Aplicação do previsto no art. 217, i, alínea c da lei 8.112/90 por analogia à união estável. Reconhecimento da sociedade de fato. Princípios constitucionais. Precedentes stf. Apelação não provida. 1. Nos termos da legislação de regência (art. 217, inciso III da Lei nº 8.112/90), a pensão de servidor público é devida ao companheiro que comprove a existência de união estável, sendo presumida a sua dependência econômica. 2. A Constituição Federal em vigor reconhece “a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar”, qual prescreve o § 3º do art. 226 e, ainda, nos termos da lei, assegura a percepção de pensão à companheira, conforme dispõe o art. 201, inc. V, com a redação da Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998. 3. Com o advento da Lei nº 9.278/96, em seu art. 1º, a união estável, restou expressamente definida enquanto entidade familiar, como a “convivência duradoura, pública e contínua de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de uma família” e arrola entre os direitos dos conviventes em entidade familiar a recíproca assistência moral e material (art. 2º, II), inclusive após a dissolução da união entre os amásios (art. 7º). 4. O art. 1.723 do Código Civil exige para fins de restar configurada a união estável que a convivência entre o casal reúna, concomitantemente, os seguintes elementos: publicidade, continuidade, durabilidade e finalidade de constituir família. 5. O Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento que discute a equiparação entre cônjuge e companheiro para fins de sucessão, inclusive em uniões homo afetivas. A decisão foi proferida no julgamento dos Recursos Extraordinários RE 646721 e 878694, ambos com repercussão geral reconhecida. Declarou o STF que é inconstitucional o artigo 1.790 do Código Civil, que estabelece diferenças entre a participação do companheiro e do cônjuge na sucessão dos bens. A conclusão da Suprema Corte foi no sentido de que não existe elemento de discriminação que justifique o tratamento diferenciado entre cônjuge e companheiro estabelecido pelo Código Civil, cabível a extensão dos efeitos independentemente de orientação sexual. Precedentes. 6. Trata-se de posicionamento pacificado do STF, de que devem ser consideradas todas as formas de entidades familiares constitucionalmente previstas (art. 226, §§ 1º a 4º), a saber, a constituída pelo casamento e pela união estável, bem como a monoparental. 7. A união estável entre o homem e a mulher, configurada na “convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família” não obsta que a união de pessoas do mesmo sexo possa ser reconhecida como entidade familiar apta a merecer proteção estatal. Sendo assim, a família seria, por natureza ou no plano dos fatos, vocacionalmente amorosa, parental e protetora dos respectivos membros, constituindo-se no espaço ideal das mais duradouras, afetivas, solidárias ou espiritualizadas relações humanas de índole privada, o que a credenciaria como base da sociedade – CF, art. 226, caput. (cf. ADI 4277/DF e ADPF 132/RJ) 8. Na hipótese, há que se verificar se restaram comprovados os requisitos caracterizadores da união estável devendo ser analisado in concreto o preenchimento dos requisitos de convivência duradoura, pública e continua, com o objetivo de constituir entidade familiar. 9. Narra a parte autora que mantém união estável com a Sra. Maria das Graças Bessera da Penha desde 1984 e requereu a inclusão de sua companheira como dependente/beneficiária no âmbito administrativo, sendo negado o pedido ao argumento de que o serviço público federal não reconhece como pensionista, companheiros e companheiras do mesmo sexo. 10. Restou comprovada a existência de união homoafetiva através dos documentos acostados aos autos, onde constam os nomes da autora e sua companheira, tais como, declaração de convivência homoafetiva para fins sucessórios, previdenciários e sociais (85690900 – Pág. 33), testamento (85690900 – Pág. 36/37), contrato de abertura de conta corrente e de poupança conjunta (85690900 – Pág. 38), título de capitalização nominativo (85690900 – Pág. 45), fotos pessoais que retratam a vida doméstica e situações familiares de convivência (85690900 – Pág. 86/89 e 85690901 – Pág. 1/4) e outros, em que se observa que ambas mantêm mesma residência, situação que evidencia vida em comum. 11. O conjunto probatório corrobora as alegações da autora e comprovam a qualidade de companheira da Sra. Maria das Graças Beserra da Penha, e, portanto, a qualidade de dependente e beneficiária para fins de concessão de benefício previdenciário, de modo que não merece reparos a sentença ora combatida. 12. Apelação não provida. (TRF-3 – ApReeNec 00272265220044036100, 1ª T. Rel. Des. Fed. Wilson Zauhy Filho, j. 06/01/2020).