TRF-2 – Rio de Janeiro – Administrativo. Pensão estatutária por morte. Inépcia da inicial – não configurada. União homoafetiva. Inteligência do art. 226, § 3º da CR/88 e do art. 1723 do código civil/2002. Princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da igualdade, da não discriminação, união estável. Comprovação. Artigo 217, inciso i, “c”; da lei n.º 8.112/90. Honorários advocatícios. Art. 20, § 4º, do CPC. Fazenda pública. Apreciação equitativa do juiz. 1. Vislumbrando-se a consonância da exordial com o disposto no art. 282 do CPC, vez que a causa de pedir e o pedido encontram-se ao alcance do julgador, não se configurando qualquer óbice quer para defesa, com o regular desenvolvimento do processo, quer para a apreciação judicial, não há falar em inépcia da inicial. 2. Improspera a alegação de que os documentos juntados pelo apelado não têm qualquer valor jurídico, pelo mero argumento de não serem autenticados, uma vez que a apelante não apontou qualquer fraude ou falta de autenticação que justificasse a existência de distorções no conteúdo do documento a ensejar dúvida acerca da autenticidade (TRF 1a REGIÃO, AC 199838000267190/MG, DJ de 09/10/2006). 3. Há que se aplicar o direito à luz de diversos preceitos constitucionais e não apenas atendo-se à interpretação literal do art. 226, §3º da Constituição Federal, invocado pela recorrente, que não diz respeito ao âmbito previdenciário, inserindo-se no capítulo ‘Da Família’, sendo certo que não houve de parte do constituinte, exclusão dos relacionamentos homoafetivos, com vista à produção de efeitos no campo do direito previdenciário, configurando-se mera lacuna, que deverá ser preenchida a partir de outras fontes do direito (STJ, RESP 395904, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 06/02/2006). 4. Conforme registrado pelo STF no julgamento da ADI 3300 MC/DF, o magistério da doutrina, apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva, utilizando-se da analogia e invocando princípios fundamentais (como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da autodeterminação, da igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não-discriminação e da busca da felicidade), tem revelado admirável percepção do alto significado de que se revestem tanto o reconhecimento do direito personalíssimo à orientação sexual, de um lado, quanto a proclamação da legitimidade ético-jurídica da união homoafetiva como entidade familiar, de outro, em ordem a permitir que se extraiam, em favor de parceiros homossexuais, relevantes conseqüências no plano do Direito e na esfera das relações sociais. 5. Uma vez reconhecida, numa interpretação dos princípios norteadores da constituição pátria, a união entre homossexuais como possível de ser abarcada dentro do conceito de entidade familiar e afastados quaisquer impedimentos de natureza atuarial, deve a relação da Previdência para com os casais de mesmo sexo dar-se nos mesmos moldes das uniões estáveis entre heterossexuais, devendo ser exigido dos primeiros o mesmo que se exige dos segundos para fins de comprovação do vínculo afetivo e dependência econômica presumida entre os casais (…), quando do processamento dos pedidos de pensão por morte e auxílio-reclusão. (Revista do TRF/4ª Região, vol. 57/309-348, 310, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira – grifei) in STF, ADI 3300 MC/DF. 6. A prova pré-constituída, configurada na documentação trazida aos autos, irradia o direito líquido e certo do recorrido, como que se extrai da documentação produzida no processo, que comprova que: o instituidor residia no mesmo endereço que o autor, quando do seu óbito (faturas de serviços de luz; IPTU, cota condominial); o ex-servidor efetuou doação ao requerente, em 08/10/2001, do imóvel em que viviam; designou expressamente o autor, na qualidade de seu companheiro há 21 anos, como o beneficiário de sua pensão estatutária, na forma prevista no art. 217 da Lei 8.112/90 (termo de fl. 11), declarando-o como seu dependente econômico e reconhecendo a união estável desde o ano de 1985. 7. Honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), com base no art. 20, § 4º do CPC e atento aos parâmetros das alíneas “a”, “b” e “c” do § 3º, eis que vencida a Fazenda Pública. 8. Recurso da UNIÃO desprovido e remessa necessária provida parcialmente. (TRF-2 – AC 2006.51.01.021811-7, 8ª T. Esp., Rel. Poul Erik Dyrlund, j. 31/03/2009.)