Mato Grosso – Apelação cível. Ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais e dano temporal. Recusa de atualização cadastral de pessoa transgênero. Vínculo fraudulento de linhas telefônicas. Falha na prestação de serviço. Dano moral configurado. Inexistência de dano temporal. Majoração da indenização. Parcial provimento do recurso da autora. Não provimento do recurso da ré. I. Caso em exame. 1. Apelações cíveis interpostas em face de sentença que julgou parcialmente procedente ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais e dano temporal, promovida por pessoa transgênero contra operadora de telefonia, condenando-a à atualização cadastral e ao pagamento de R$ 6.000,00 a título de danos morais. 2. A autora alegou que, após a retificação judicial de seu nome e gênero no registro civil, teve indeferido o pedido de alteração cadastral por supostas pendências vinculadas a linhas telefônicas fraudulentamente contratadas. Pleiteou indenização por danos morais e reconhecimento de dano temporal. II. Questão em discussão. 3. Há três questões em discussão: (i) saber se a autora faz jus à gratuidade da justiça, diante da impugnação da parte ré; (ii) saber se houve falha na prestação de serviço pela negativa de atualização cadastral com base em contratos telefônicos não comprovadamente firmados pela autora; e (iii) saber se o valor fixado a título de danos morais deve ser majorado, bem como se é cabível indenização autônoma por dano temporal. III. Razões de decidir. 4. A declaração de hipossuficiência firmada nos autos goza de presunção de veracidade, conforme o art. 99, § 3º, do CPC, não havendo elementos concretos apresentados pela parte adversa que a infirmem. Rejeita-se a preliminar. 5. A negativa da empresa em atualizar os dados cadastrais da autora após a retificação judicial de nome e gênero configura violação de direitos da personalidade, especialmente da dignidade humana e da identidade de gênero, conforme reconhecido pelo STF na ADI 4.275/DF .6. As telas sistêmicas unilaterais não se mostram aptas à comprovação da contratação das linhas telefônicas em nome da autora, especialmente diante de boletim de ocorrência registrado e da divergência de endereços, o que configura indício robusto de fraude. 7. Restou caracterizada falha na prestação de serviço, atraindo a responsabilidade objetiva do fornecedor, conforme o art. 14 do CDC. A recusa discriminatória da operadora em atualizar o cadastro vincula-se diretamente ao dano moral sofrido. 8. A indenização por danos morais deve ser majorada para R$ 10 .000,00, considerando-se a gravidade da conduta e o caráter pedagógico da reparação. O valor atende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. IV. Dispositivo e tese. 11. Recurso da ré não provido. Recurso da autora parcialmente provido. 12. Tese de julgamento: “1. A recusa injustificada de atualização cadastral de pessoa transgênero após retificação judicial de nome e gênero configura falha na prestação de serviço e enseja reparação por danos morais. 2. A vinculação de linhas telefônicas fraudulentas ao CPF do consumidor, sem prova robusta da contratação, atrai a responsabilidade objetiva da operadora. 3. Provas unilaterais, como telas sistêmicas, são inidôneas para comprovar a efetiva contratação.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, V e X; CC, arts. 405, 927; CDC, arts . 6º, III, 14 e 42, p.u.; CPC, arts. 99, § 3º, 373, II, e 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STF, ADI 4.275/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, j. 01.03.2018; STJ, AgInt no REsp 1.493 .332/DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 27 .04.2017; TJMT, ApC 1000604-28.2023.8 .11.0107, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 29.08.2025; TJMT, ApC 1009479-08.2023 .8.11.0003, Rel. Des. Anglizey Solivan, j. 23.07.2025. TJMT – AC 10096239620228110041, 4ª C. Dir. Privado, Rel. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 18/09/2025.