STF – Constitucional. Mandado de injunção. Lei Maria da Penha. Violência doméstica ou intrafamiliar. Relações familiares homoafetivas. Homens GBTI+. Travestis. Transexuais. Direito fundamental à segurança. Princípio da igualdade. Configurada a omissão legislativa do congresso nacional. Ordem concedida. I. Caso em exame. 1. Mandado de Injunção Coletivo impetrado em face de omissão legislativa atribuída ao Congresso Nacional, relativamente à edição de legislação específica contra a violência doméstica ou intrafamiliar que proteja homens GBTI+, bem como legislação preventiva e supressiva do controle coercitivo contra homens GBTI+ e mulheres. II. Questão Em Discussão. 2. Verificar a existência de omissão, caracterizadora do estado de mora constitucional, na legislação brasileira contra violência doméstica ou intrafamiliar, no âmbito de proteção das pessoas em relações familiares homoafetivas, quando as vítimas não sejam mulheres. III. Razões de decidir. 3. O Mandado de Injunção é uma ação constitucional autoaplicável, de caráter civil e de procedimento especial, que visa suprir uma omissão do Poder Público, no intuito de viabilizar o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista na Constituição Federal, visando afastar o que Aricê Moacyr Amaral Santos aponta como a inércia da norma constitucional, decorrente da omissão normativa (Mandado de injunção. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 31), ou no dizer de CANOTILHO, buscando destruir o rochedo de bronze da incensurabilidade do silêncio legislativo (As garantias do cidadão na justiça. Coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 367). 4. A comparação entre o consenso nacional e internacional sobre as medidas necessárias para a efetiva proteção contra violência doméstica nas relações homoafetivas da população GBTI+ e a legislação nacional demonstra a existência de significativa omissão constitucional do Poder Legislativo em efetivar a devida proteção legal aos direitos e liberdades fundamentais da comunidade GBTI+. 5. Considerando que a Lei Maria da Penha foi editada para proteger a mulher contra violência doméstica, a partir da compreensão de subordinação cultural da mulher na sociedade, é possível estender a incidência da norma aos casais homoafetivos do sexo masculino, se estiverem presentes fatores contextuais que insiram o homem vítima da violência na posição de subalternidade dentro da relação. 6. A não incidência da Lei Maria da Penha aos casais homoafetivos masculinos e às mulheres travestis ou transexuais nas relações intrafamiliares pode gerar uma lacuna na proteção e punição contra a violência doméstica, já que esses acontecimentos permeiam a sociedade de forma atroz. Há, portanto, uma responsabilidade do Estado em garantir a proteção, no campo doméstico, a todos os tipos de entidades familiares. 7. Configurada a omissão legislativa, ante a ausência de norma que estenda a proteção da Lei Maria da Penha aos homens GBTI+, vítimas de violência doméstica, circunstância que tem inviabilizado a fruição do direito fundamental à segurança por este grupo social, considerada especialmente a proibição de proteção deficiente oriunda do princípio da proporcionalidade. IV. Dispositivo. 8. Ordem concedida para reconhecer a mora legislativa e determinar a incidência da norma protetiva da Lei Maria da Penha aos casais homoafetivos do sexo masculino e às mulheres travestis ou transexuais nas relações intrafamiliares. Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal, art. 1º, III, art. 3º, art. 5º, caput, I, LXXI, XLI, art. 226, § 8º; Lei 11.340/2006. STF – MI 7.452 – Tribunal Pleno, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 24/02/2025.