STJ – Recurso especial. Ação de obrigação de faze4r c/c compensação por dano moral. Negativa de prestação jurisdicional. Ausência. Plano de saúde. Mulher transexual. Procedimentos cirúrgicos prescritos pelo médico assistente no processo transexualizador. Reconhecimento pelo CFM e incorporação ao SUS. Alegação de caráter experimental e finalidade estética afastada. Procedimentos listados no rol da ANS sem diretrizes de utilização. Negativa indevida de cobertura. Dano moral configurado. Valor proporcional. 2. O propósito recursal é decidir sobre: (I) a negativa de prestação jurisdicional; (II) a obrigatoriedade de cobertura, pela operadora do plano de saúde, de cirurgias de transgenitalização e de plástica mamária com implantação de próteses, em mulher transexual; (III) a ocorrência de dano moral; e (IV) a proporcionalidade do valor arbitrado a título de compensação por dano moral. 3. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que não há ofensa ao art. 1.022 do CPC quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese soluciona integralmente a controvérsia submetida à sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela pretendida pela parte. 4. Os procedimentos de afirmação de gênero do masculino para o feminino são reconhecidos pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e foram também incorporados ao SUS, com indicação para o processo transexualizador, constando, inclusive, na tabela de procedimentos, medicamentos, órteses, próteses e materiais especiais do SUS, vinculados ao CID 10 F640 – transexualismo (atual CID 11 HA60 – incongruência de gênero), não se tratando, pois, de procedimentos experimentais. 5. No processo transexualizador, a cirurgia plástica mamária reconstrutiva bilateral incluindo prótese mamária de silicone é procedimento que, muito antes de melhorar a aparência, visa à afirmação do próprio gênero, incluída no conceito de saúde integral do ser humano, enquanto medida de prevenção ao adoecimento decorrente do sofrimento causado pela incongruência de gênero, pelo preconceito e pelo estigma social vivido por quem experiencia a inadequação de um corpo masculino à sua identidade feminina. 6. Tratando-se de procedimentos cirúrgicos prescritos pelo médico assistente, que não se enquadram nas exceções do art. 10 da Lei 9.656/1998, que são reconhecidos pelo CFM e foram incorporados ao SUS para a mesma indicação clínica (CID 10 F640 – transexualismo, atual CID 11 HA60 – incongruência de gênero), e que estão listados no rol da ANS sem diretrizes de utilização, encontram-se satisfeitos os pressupostos que impõem à operadora do plano de saúde a obrigação de sua cobertura, conforme preconizado no projeto terapêutico singular norteado por protocolos e diretrizes vigentes para o processo transexualizador. 7. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o descumprimento contratual por parte da operadora de saúde, que culmina em negativa de cobertura para procedimento médico-hospitalar, enseja compensação por dano moral quando houver agravamento da condição de dor, abalo psicológico ou prejuízos à saúde já debilitada da paciente, como afirmado pelo Tribunal de origem, na hipótese. 8. Sobre a análise do montante fixado pelas instâncias ordinárias a título de compensação do dano moral, esta Corte somente afasta a incidência da súmula 7/STJ quando se mostrar irrisório ou abusivo, o que não se configura no particular. 9. Recurso especial conhecido e desprovido, com majoração de honorários. (STJ – REsp 2097812 MG 2023/0339608-3, 3ª T. Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 21/11/2023).